Psicólogo Lucas Kowaleski

Um tempo pra mim

Você já teve a sensação de que está constantemente atrasado ou atrasada para seus compromissos? Que constantemente não consegue cumprir aquilo que você mesmo disse que faria? Ou com uma sensação de que está sempre devendo algo para si ou para a vida? Pois bem, talvez a forma como lidamos com o tempo na atualidade esteja nos deixando em sofrimento.

Acredito que o leitor e a leitora já tenham se deparado com uma situação das citadas acima. Talvez um livro que fica na cabeceira da cama e que não consegue terminar de ler. A parede que precisa ser pintada, mas ainda não conseguiu comprar a tinta. Um amigo que você precisa visitar, mas falta tempo. O esporte que você quer praticar, mas acaba tendo que desmarcar toda vez porque está cansada demais.

Nosso estilo de vida contemporâneo perde cada vez mais o espaço de experienciar as coisas e os momentos para uma vivência desenfreada de um turbilhão de estímulos. Cotidianamente, somos bombardeados por vídeos de tik tok, ou instagram, os quais passamos horas do dia (nos entretendo?) sem efetivamente extrair algum saber sobre aquilo. Assim também acontece com o trabalho, que deveria ser uma forma de nós experienciarmos a vida criativamente dentro da perspectiva de uma prática, um saber-fazer. Mas que, acaba se tornando algo repetitivo, marcado pela necessidade de atingir metas e demandas impossíveis, única e exclusivamente em prol do ganho financeiro e do consumo. Até mesmo o tempo que deveria ser para o prazer é algo que precisa ser consumido. Como diz Maria Rita Kehl (2010) em seu livro O tempo e o cão, “nada causa tanto escândalo, em nosso tempo, quanto o tempo vazio. É preciso ‘aproveitar’ o tempo, fazer render a vida, sem preguiça e sem descanso” (p. 125). Nesse sentido, até mesmo o tempo que teríamos para descansar ou nos divertir acaba virando uma espécie de trabalho.

O fato é que fica difícil para nós, sujeitos contemporâneos, estar à altura desse funcionamento acelerado do tempo. Fica difícil experienciar um percurso de vida, construir narrativas que possibilitem vislumbrar um futuro, pois precisamos estar a todo momento enfrentando a dívida simbólica do desempenho.

Talvez, seja necessário inventar uma vida fora da lógica econômica de ganhos e perdas e alargar o rio da existência, incrementando nela um deleite pela dúvida. A incerteza possui em si o belo que dá movimento a vida, que nos retira da cena cristalizada da existência como algo dado e nos faz respirar uma brisa de novos ares.

Referências

KEHL, Maria Rita. O tempo e o cão. São Paulo: BOD GmbH DE, 2009.

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